Demétrio Magnoli é doutor em Geografia Humana, Autor e
co-autor de diversas obras, também é colunista de diversos periódicos, como a
Revista Época, Estadão e a Folha de S. Paulo.
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Quando visitou o país, o criador do Facebook, Marck Zuckerberg, foi saudado
pelo banner viral “Bem-vindo à China, fundador do website Erro 404” , difundido pelos
blogueiros chineses. Fruto da eficácia negativa do Grande Firewall da China
(GFC), a mensagem “Erro 404”
alerta que o servidor não encontrou o endereço solicitado, repete-se em escala
descomunal nas telas de computadores e celulares do país. O Escudo Dourado,
nome oficial do GFC, encomendado pelo Ministério da Segurança Pública, começou
a operar em 2003. As ambições do projeto ultrapassam largamente a simples
censura: trata-se de avançar rumo à implantação de uma gigantesca base de dados
analítica de textos e imagens publicados pelos usuários da rede virtual com
tecnologias que abrangem reconhecimento facial e de voz. Continue lendo...
Totalitarismo é algo bem diferente de autoritarismo. O segundo ampara-se,
exclusivamente, na força e se contenta em calar, prender ou eliminar
opositores. O primeiro também se ampara na força, mas nutre a pretensão de
persuadir a sociedade a acreditar no seu enredo sobre a História — ou seja,
numa narrativa que o torna depositário de uma legitimidade transcedental.
George Orwell explicou isso: “O Estado totalitário é, efetivamente, uma
teocracia e sua casta dirigente, a fim de conservar sua posição, deve ser vista
como infalível. Mas como, na prática, ninguém é infalível, torna-se
frequentemente necessário rearranjar os eventos passados de modo a mostrar que
este ou aquele erro não ocorreu ou que este ou aquele triunfo imaginário
realmente aconteceu.” Eis o motivo pelo qual a política do totalitarismo
demanda o controle sobre a linguagem empregada pelas pessoas. Não é trivial
exercer tal controle na era da internet.Os totalitarismos do século XX detinham o monopólio dos grandes meios de comunicação da época: o rádio, o cinema, a televisão. Os regimes de Stalin, Mussolini e Hitler tinham consciência do valor político das mídias de massa e empenharam-se no seu desenvolvimento tecnológico e no aprimoramento técnico e artístico das mensagens que difundiam. Contudo, as redes sociais da internet são intrinsecamente distintas das mídias eletrônicas tradicionais, pois todos os participantes podem operar como emissores de mensagens. Na China, o Twitter é proibido, mas serviços nacionais similares contam com mais de 200 milhões de usuários. Por meio deles, dezenas de milhares de microblogueiros formam a vanguarda da dissidência política, organizando protestos de rua e denunciando a corrupção oficial.
À sombra do “Erro
Ai Weiwei saltou a etapa da ironia, entregando-se ao sarcasmo. O artista plástico, consultor dos arquitetos que projetaram o estádio olímpico Ninho do Pássaro, tornou-se um dos mais notórios dissidentes chineses. Multado, encarcerado e espancado, ele não se “harmonizou”. Meses atrás, postou no Youtube um vídeo em que aparece dançando no “estilo Gangnam” e usando algemas. Antes disso, diante da instalação de 15 câmeras para o monitoramento policial de seus movimentos, conectou à internet a “weiweicam”, uma câmera que filma sem parar o cenário de seu quarto. “Acho que eles não sabem como lidar com alguém como eu e meio que desistiram de me gerenciar”, sugeriu em entrevista recente. O escárnio fere o totalitarismo ainda mais que a acusação racional ou a denúncia moral.
Na opinião de Weiwei, a democracia chegará à China na década de 2020. Entre os analistas ocidentais, vulgarizou-se o precário paralelo com a Coreia do Sul e Taiwan, que transitaram para a democracia no compasso da modernização econômica, da urbanização e da consolidação de uma classe média cosmopolita. De acordo com essa linha otimista de interpretação, a própria elite dirigente chinesa administrará uma transição política gradual, dissolvendo aos poucos os grilhões do sistema totalitário.
Tudo é possível. O certo é que não há precedentes adequados para orientar a análise. Entre as inúmeras singularidades históricas da China, a mais relevante encontra-se justamente na universalização das redes sociais ao abrigo de um Estado totalitário. O poder de Mao Tsetung não foi abalado pela maior crise de fome do século XX. Em contraste, o “Erro
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