Clóvis Rossi é jornalista de esquerda com mais de 40 anos de
carreira, colunista da Folha de S. Paulo. já trabalhou em três dos quatro
grandes jornais do país, Estadão, Folha e JB.
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É assustador quando uma garota de 25 anos (Leila Saraiva, do
Movimento Passe Livre) constata "um despreparo gigantesco do governo"
para tratar de mobilidade urbana, afinal o tema que incendiou originalmente a
rua.
Palavra de testemunha ocular, posto que Leila participou da reunião da presidente Dilma Rousseff com o MPL.
Seria um comentário assustador, qualquer que fosse o presidente. Mas torna-se exponencialmente grave quando a mandatária em questão gosta de ser vista como gerente, como técnica.
Pior ainda é que comentário semelhante poderia ser aplicado ao tratamento da questão política, o verdadeiro nó que amarra o país, não só de parte do governo federal, mas de todas as esferas de poder.
É despreparo uma governante lançar solenemente uma proposta --a tal reforma política via processo constituinte exclusivo-- para derrubá-la menos de 24 horas depois, supostamente por ter se convencido de que era inconstitucional. Pode ser, pode não ser, uma vez que juristas, políticos e até ministros do Supremo Tribunal Federal bateram cabeça em torno da inconstitucionalidade da proposta.
Joaquim Barbosa, o chefe do Poder Judiciário, por exemplo, deu todos os sinais, embora em linguagem tortuosa, de que prefere uma constituinte exclusiva, a partir de um argumento irrefutável: o Congresso ordinário já demonstrou à saciedade que não tem a menor vontade de mexer no jogo que beneficia seus membros.
O recuo de Dilma significa que ela deixa a tarefa de "oxigenar o sistema político" nas mãos de quem o poluiu até níveis insuportáveis. Continue lendo...
O Congresso deu, aliás, na mesma terça-feira, mais provas de que também é
afetado por "gigantesco despreparo". Votou quase por unanimidade o
fim da PEC 37, mas não por convicção. Havia ao menos 200 deputados favoráveis a
ela, mas todos (menos nove) enfiaram a viola no saco com medo da rua. Ainda bem
que o fizeram, mas não pode ser o volume da voz da rua o único elemento para
decidir o voto.Palavra de testemunha ocular, posto que Leila participou da reunião da presidente Dilma Rousseff com o MPL.
Seria um comentário assustador, qualquer que fosse o presidente. Mas torna-se exponencialmente grave quando a mandatária em questão gosta de ser vista como gerente, como técnica.
Pior ainda é que comentário semelhante poderia ser aplicado ao tratamento da questão política, o verdadeiro nó que amarra o país, não só de parte do governo federal, mas de todas as esferas de poder.
É despreparo uma governante lançar solenemente uma proposta --a tal reforma política via processo constituinte exclusivo-- para derrubá-la menos de 24 horas depois, supostamente por ter se convencido de que era inconstitucional. Pode ser, pode não ser, uma vez que juristas, políticos e até ministros do Supremo Tribunal Federal bateram cabeça em torno da inconstitucionalidade da proposta.
Joaquim Barbosa, o chefe do Poder Judiciário, por exemplo, deu todos os sinais, embora em linguagem tortuosa, de que prefere uma constituinte exclusiva, a partir de um argumento irrefutável: o Congresso ordinário já demonstrou à saciedade que não tem a menor vontade de mexer no jogo que beneficia seus membros.
O recuo de Dilma significa que ela deixa a tarefa de "oxigenar o sistema político" nas mãos de quem o poluiu até níveis insuportáveis. Continue lendo...
Que o Congresso está agindo só para acalmar a massa, à espera de que ela se canse, prova-o o fato de que Renan Calheiros --ele também na mira da rua-- não mencionou entre as medidas que quer votar com urgência a eliminação, por exemplo, dos "auxiliares de embarque" regiamente pagos, à disposição dos congressistas nos aeroportos. É apenas um dos incontáveis privilégios inaceitáveis de que gozam os políticos --e nenhum será tocado se o voto for distrital ou seguir como está, se o financiamento das campanhas for público ou não.
Para fechar o círculo, no mesmo dia em que a presidente anunciava mais verbas para mobilidade urbana, o "Valor Econômico" demonstrava que o programa Mobilidade Urbana-Grandes Cidades, lançado em abril de 2012, não saiu do papel: "De um total de R$ 10,2 bilhões de repasse da União disponíveis a fundo perdido, menos de 7% foram contratados. Ou seja, há R$ 9,5 bilhões parados no Ministério das Cidades".
O "gigantesco despreparo" é, pois, do Estado brasileiro.
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