domingo, 17 de março de 2013

VISÃO É UM PROBLEMA SÉRIO NAS CRIANÇAS DO BRASIL

Foto ilustrativa
PROBLEMA VISUAL AFETA 15 MILHÕES DE CRIANÇAS 
NÚMERO EQUIVALE A 30% DOS MENINOS E MENINAS EM IDADE ESCOLAR
Layssa Khayat - Da Redação
Os problemas de visão respondem por grande parte da dificuldade de aprendizagem. Dados epidemiológicos divulgados pelo Ministério da Saúde mostram que 15 milhões de crianças em idade escolar, o que corresponde a 30% do todo, apresentam problemas de refração ocular, como miopia, astigmatismo e hipermetropia. O Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) alerta que de 3% a 10% das crianças de 7 a 10 anos do país precisam usar óculos.
A deficiência pode passar despercebida por falta de conhecimento dos pais. A boa notícia é que, se a refração ocular for descoberta até os 7 anos de idade, evitando que alcance estágios mais avançados, as doenças podem ser prevenidas e tratadas. É o que afirma Ingrid Cavalcante, oftalmogista que atende no Hospital Universitário Bettina Ferro de Souza, referência na área no Estado e vinculado à Universidade Federal do Pará (UFPA). Depois dessa faixa etária, mesmo com o uso de óculos, a probabilidade de um desenvolvimento saudável dos olhos recai drasticamente.
"O cérebro da criança só vai querer enxergar imagem nítida. Ele vai suprimir aquele olho que está com grau alto. É como se esse olho não fosse aprender a enxergar. Se você corrigir antes dos sete anos, o cérebro ainda consegue detectar que aquele olho existe. Se for depois dos sete anos, fica muito difícil você fazer o sistema neurológico detectar que aquele pode enxergar. A criança se torna um adulto com praticamente uma visão monocular", explica. Continue lendo...
Para evitar que a refração ocular avance e prejudique o aprendizado da criança, a especialista garante que o melhor meio é a prevenção. "Os pais acham que só têm que levar ao oftalmologista quando tem queixa. O ideal é levar pra prevenir para que você possa detectar precocemente qualquer patologia, e não esperar acontecer, agravar pra procurar o médico. O cérebro da criança está em formação, todo o corpo também está em formação, inclusive o olho. Assim como a criança precisa aprender a andar, falar, o olho precisa aprender a enxergar. Se tiver alguma coisa dificultando esse olho de ver de forma clara, você tem que corrigir logo para que ele possa ter um bom desenvolvimento", informa, acrescentando que crianças até um ano de idade devem ser consultadas duas vezes por ano pelo oftalmologista e, depois dessa idade, a visita deve ser anual.
Professoras têm mais facilidade para perceber do que os pais
Ediléia Prazeres analisa que em décadas de experiência na área da educação o que a chama mais atenção é a falta de percepção dos pais. "A gente percebe que falta mais informação para os pais. Existem muitos que não observam essa situação. Pode ser pelo corre-corre do dia a dia ou não note mesmo. Pra alguns deles, recai sobre a escola identificar os problemas das crianças. Então, quando a gente chama os pais já fizemos todas as verificações", alega.
Dentro da sala de aula é a professora quem tem contato mais próximo dos alunos e geralmente a primeira a observar alguma patologia. É o que diz Dhemia de Cássia da Costa, professora há 15 anos do Ensino Infantil. Ela contou que alguns sintomas são conhecidos em se tratando de problema de visão: as crianças coçam os olhos com frequência elevada.
"Já detectei algumas crianças entre 4 e 5 anos que tinham problema de vista. A gente trabalha muito com quadro dentro da sala de aula. E a criança logo pede pra se sentar mais na frente ou pra sair, dizendo ‘tia, tá coçando o meu olho’, porque forçaram a vista pra enxergar o que estava escrito", exemplifica.
Outro sintoma que a professora observa são as linhas do caderno. Algumas crianças que apresentam problemas visuais não conseguem enxergar a linha cinza do caderno. Uma solução "paliativa" foi pintar tais linhas de vermelho. Além disso, Dhemia relata que essas crianças giram o papel em aulas de desenho, cola e pintura; e o rosto está sempre muito próximo ao livro para ler e ao caderno para escrever.
"As crianças com problemas de visão têm mais dificuldade na linguagem, na escrita, no copiar. Isso também interfere no raciocínio lógico delas. Uns pais tomam providências imediatamente; outros, não. Quando chamo os pais pra falar sobre o problema, alguns não querem (o uso de óculos) por estética e me falam que a filha vai ficar com cara de velhinha. A gente se pergunta o que é mais importante", avalia. A professora admite que já pensou em reprovar alunos por baixo rendimento escolar, prejudicado por problemas de visão, no entanto, "muitos pais não veem nisso um motivo plausível para repetir o ano."
Baixo rendimento escolar pode ser um dos sintomas da refração
Quando a criança reclama de certo desconforto na região dos olhos, o olho lacrimeja e coça com facilidade depois de um esforço visual, assiste televisão muito próximo à tela e dores de cabeça constantes podem ser sinais para os pais de que a visão do filho provavelmente está doente. A oftalmologista Ingrid aconselha uma hora de intervalo a cada três horas em frente ao computador ou televisão, por exemplo. "Um intervalo pra tomar água, passear, para que o olho não fique tão acomodado, tão concentrado, contraindo a musculatura, porque a visão de perto exige uma contração. A criança precisa dar uns intervalos de relaxamento pra esse olho", sugere.
Um ambiente comum para se perceber o reflexo que a falta de saúde ocular pode gerar no aprendizado é nas escolas. Na sala de aula, nas atividades ao ar livre e na interação com os colegas de turma, coordenadores e professores avaliam o rendimento dos alunos. Em muitas situações, os problemas de visão prejudicam a evolução escolar das crianças e podem, em último caso, ocasionar repetência.
Ediléia Alves dos Prazeres é coordenadora do Ensino Infantil de uma escola particular e trabalha há 30 anos como orientadora educacional. Ela explica que a refração ocular pode ser identificada antes da alfabetização, durante as aulas de pintura e desenho, por exemplo. Quando o aluno não consegue desempenhar determinada atividade e o rendimento é baixo, supostamente por causa de um problema visual, Ediléia pede aos pais da criança que consultem um especialista e levem o diagnóstico para a escola. "Às vezes, os pais não percebem. Quando a criança começou a usar óculos, de imediato aumentou o rendimento. Ela tinha dificuldades, mas não sabia dizer o porquê", observa, referindo-se a um dos casos que já identificou.
Para a avaliação escolar a cada trimestre, a coordenadora conta que a escola providencia letras em tamanho maior e na cor vermelha, além de um acompanhamento paralelo do professor.
Projetos - Crianças receberão gratuitamente atendimentos de baixa complexidade em oftalmologia dentro de escolas, ainda este ano, por profissionais do Hospital Universitário Bettina Ferro de Souza (HUBFS). A assistência faz parte do Projeto Consultórios Itinerante, integrado ao Programa Saúde na Escola (PSE), dos Ministérios da Saúde e da Educação.
Segundo o diretor geral do HUBFS, o médico Paulo Amorim, o projeto será implantado em unidade móvel e, ainda neste semestre, o Hospital Bettina receberá dois caminhões-baú oftalmológicos equipados com um consultório e um laboratório para montagem de óculos, além de recepção e sala de espera.
Durante o atendimento no programa, os cidadãos terão acesso gratuito à medida de refração ocular, ao fornecimento de óculos, ao diagnóstico precoce de patologias relacionadas à retina ou ao estado dos vasos (exame de fundo de olho), entre outros procedimentos.
Certos tipos de comportamento podem servir de indicação
Débora Pinheiro Gonçalves passa por este tipo de problema em casa. A filha Isadora, de 7 anos, sofre de astigmatismo e miopia, e ela luta para que a refração ocular não cause atraso escolar para a criança, que está no 2º ano do Ensino Fundamental.
A mãe de Isadora conta que foi a escola que detectou o problema visual da filha. "Eu estava numa correria e também fazia faculdade. Achava que era preguiça, desinteresse dela. É muito difícil pra uma mãe reconhecer o problema. Quando a professora me chamou pra falar, disse ‘não, professora, é porque ela demorou a falar’. Dei uma resposta como se fosse nada daquilo. Sozinha, talvez eu não tivesse percebido até hoje. A indicação da professora foi fundamental", lembra.
Porém, a notícia do uso de óculos não foi bem recebida por Isadora. "No princípio, ela reclamava de tudo, até da palheta dizendo que tava apertado, É difícil pra criança se habituar aos óculos, ainda mais na escola com a questão das brincadeiras dos coleguinhas", conta a mãe, acrescentando que usa alguns truques como uma armação colorida ou que tratem de algum desenho.
Com o uso contínuo dos óculos, Débora percebeu que a filha melhorou nos estudos. "Ela não enxerga direito. Se esquecer dos óculos fica difícil estudar. Hoje, observo que ela vem melhorando no aprendizado, mas antes não conseguia nem fazer os deveres de casa sozinha", afirma. Já pequena Isadora garante que usará os óculos "só até os 10 anos" de idade. "Quando eu crescer só se for lente (de contato)", brinca.
O caso de Ana Ferreira Carvalho foi um pouco diferente do de Débora. Ana descobriu os avançados seis graus de miopia da filha Francielly, de 7 anos, devido a queixas de fortes dores de cabeça. Por um acompanhamento da mãe, a criança consegue acompanhar o rendimento escolar dos colegas de turma, porém confessa que a dor de cabeça a incomoda na maior parte do tempo apesar do uso dos óculos. "Observei que ela só sentava próximo do quadro, em cima da televisão, e também apresentava dificuldades pra ler, mas na escola ninguém notou nada", conta Ana. (Amazônia – ORM)

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